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domingo, 19 de junho de 2011

Comparando o orçamento dos EUA com o Brasileiro - Dados 2006

A figura no final do texto foi feita por um usuário do devianArt (um site muito interessante, algo como um Flickr do design gráfico). Clique aqui ou aqui para ver a versão em alta definição. Ela mostra, de uma forma visual, o orçamento federal dos Estados Unidos. É uma forma fácil e rápida de ter uma idéia de como funciona o Estado estadounidense. Além disso, temos hoje o site Contas Abertas, que permite consultar o orçamento federal brasileiro com detalhes. Comparar os dois tornou-se tentador.

As comparações que eu vou fazer não são científicas. A estrutura política norte-americana é diferente da brasileira. Eu não sei, por exemplo, qual é a divisão de tarefas entre a União e os estados lá, por exemplo (na verdade, mesmo aqui eu também não sei). A realidade social, o custo de vida, e vários outros elementos são muito diferentes. Ou seja: fazer um estudo comparativo dos dois orçamentos é um desafio dos grandes, e não é a isso que estou me prestando. Quero apenas brincar. Além disso, como se pode ver na figura, esses são apenas os gastos discricionários, ou seja, excluem gastos fixos como funcionalismo e seguridade social.
Passadas as formalidades, vamos ao que interessa:

O orçamento militar dos Estados Unidos corresponde a R$ 858 bilhões. Nosso orçamento militar é de R$ 33 bilhões. Considerando a área de cada país, os EUA gastam R$ 89.083,00 para “defender” cada km quadrado, enquanto o Brasil gasta R$ 3.860,00 para “defender” a mesma área. Levando-se em consideração o histórico de ataques estrangeiros a cada um, podemos dizer que utilizamos mais eficientemente o dinheiro.

Vale salientar que o departamento de assuntos relacionados a veteranos de guerra (sim, os EUA têm um “ministério” de ex-combatentes) leva mais R$ 60,32 bilhões. Mais do que o que gastamos com educação e saúde somados.

As estradas norte-americanas têm boa fama, não? Não é por menos. Apesar de termos quase a mesma área que lá, os gastos em estradas federais somam R$ 62,98 bilhões. Aqui? R$ 8,155 bilhões para todo o ministério dos transportes.

Apesar de as diferenças nos números serem enormes, pode-se dizer que temos uma vantagem, no quesito prioridades sociais. Nós gastamos R$ 20,028 bilhões em educação federal (que é , basicamente, ensino superior e técnico) e R$ 8,155 bilhões em transportes, uma diferença de 145% a mais para a educação. Já os EUA gastam R$ 114,24 bilhões em educação e R$ 114,56 bilhões em transportes. Isso porque lá a União cuida do ensino básico. Quem diria?

Em habitação a diferença é gigantesca. EUA: R$ 67,297 bilhões. Brasil: R $ 569,926 milhões. Isso equivale a R$ 225 por habitante nos EUA, e ridículos R$ 3,06 no Brasil. Os gastos com habitação de portadores de AIDS nos EUA é maior que o total brasileiro.

Exemplos de itens de despesas em que os EUA gastam mais do que o total que se gasta com o Bolsa-Família: caça F-22, avião C-17, F/A-18E/F Super Hornet, mísseis, financiamento militar externo, manutenção de embaixadas, guarda costeira, FBI, sistema carcerário, ônibus espacial, tratamento de dependentes de drogas, administração nuclear, proteção

ao meio-ambiente, etc.

Fonte: http://www.nacio.com.br/blog/2006/03/20/comparando-o-orcamento-dos-eua-com-o-brasileiro/

O Novo Seculo Americano / The New American Century








Descrição

Nome / Name: O Novo Seculo Americano / The New American Century - RH

Tipo de Arquivo / Type of Archive: Filme / Movie

Genero(s) / Gender: Documentario / Documentary

Observacoes / Observations: Factos Veridicos / Real Facts

Ano / Year: 2007

Idioma(s) / Languade(s): Ingles / English

Legendas / Subtitles: Portugues / Portuguese

Pais(es) / Country(s): O Planeta Terra / Planet Earth

Tempo / Time: 1:34

Historia: Documentario sobre o "Projecto para O Novo Seculo Americano" um plano desenhado por um grupo de neoconservadores do partido Republicano nos EUA.

Como este grupo de pessoas tem manipulado a politica, economia, populacoes e guerras no passado seculo.

"O GOVERNO SECRETO dentro do Governo" com o objectivo de dominar o mundo.

Fonte/Download: http://es.kat.ph/o-novo-seculo-americano-the-new-american-century-rh-t3939220.html

deformidades impunes - EUA arquivam ação sobre efeitos do Agente Laranja no Vietnã

Aviões americanos despejaram mais de 50 milhões de litros do herbicida entre 1962 e 1971 como parte de uma estratégia de destruir as plantações de arroz que alimentavam o inimigo e remover a folhagem da mata que servia de abrigo. Ação semelhante, só que movida por ex-combatentes dos EUA, resultou em indenização de US$ 93 milhões. Do Jornal do Brasil, 12 de março, 2005

NOVA YORK. Um juiz federal arquivou ontem a ação judicial na qual 4 milhões de vietnamitas acusam companhias químicas americanas de crimes de guerra pela produção do Agente Laranja, desfolhante lançado de aviões durante a Guerra do Vietnã. O juiz distrital Jack Weisntein não acolheu as alegações de que o agente tóxico e os herbicidas utilizados deveriam ser considerados venenosos e banidos segundo as leis internacionais de guerra, ainda que tenham causado os mesmos efeitos na população e nas terras sobre as quais foram lançados. "Não há base legal para qualquer das alegações sob as leis domésticas de qualquer país, nação ou estado ou sob qualquer forma de lei internacional", sentenciou.

Weinstein também afirmou que não havia, nos autos do processo, ''nada que comprovasse que o Agente Laranja tenha causado as doenças a ele atribuídas, principalmente pela ausência de uma pesquisa em larga escala''. Os responsáveis pela ação prometeram recorrer, mas há pouca esperança que o caso seja reaberto.

A ação foi a primeira tentativa de agricultores vietnamitas para buscar uma compensação pelos efeitos do Agente Laranja, que, associado à dioxina tóxica, teria causado câncer, diabetes e defeitos de nascimento. Além dos vietnamitas, civis e veteranos de guerra americanos também faziam parte da ação, já que muitos dos 10 mil feridos receberam tratamento em função da contaminação.

Os aviões americanos despejaram mais de 50 milhões de litros do herbicida entre 1962 e 1971 como parte de uma estratégia clara. O objetivo era destruir as plantações de arroz que alimentavam o inimigo e remover a folhagem da mata que servia de abrigo.

Advogados da Monsanto, Dow Chemical e mais de uma dúzia de outras companhias disseram que seus clientes não poderiam ser punidos por algo que foi feito a partir de uma ordem legal dada pelos comandantes-chefe da nação. Também argumentaram que a lei internacional geralmente livra de culpa as corporações, ao contrário dos indivíduos, por sua relação com crimes de guerra.

"Sempre afirmamos que qualquer pendência relativa aos períodos de guerra deveria ser resolvida entre os governos americano e vietnamita. Acreditamos que os desfolhantes salvaram vidas ao protegerem as tropas aliadas de emboscadas inimigas sem criar efeitos ruins para a saúde", disse um porta voz da Monsanto.

O departamento de Justiça apoiou a causa das companhias no tribunal. O argumento do Pentágono se baseou na avaliação de que uma sentença contra elas prejudicaria o poder do presidente de dirigir operações militares.

Para o advogado dos agricultores, William Goodman, o juiz cometeu um erro claro ao decidir que o Agente Laranja não é um veneno e não deu o caso por encerrado. "O uso desse químico no Vietnã foi um escândalo desde o início e a incapacidade da corte de reparar os erros é a continuação dele", emendou.

No Vietnã, a decisão da Justiça foi recebida com revolta. "É injusta e irresponsável", protestou Nguyen Trong Nhan, vice-presidente da Associação Vietnamita do Agente Laranja. "Weinstein fechou os olhos à verdade óbvia. É uma vergonha para ele. Queremos justiça, nada mais", completou.

Ao lado de Nhan, o ex-soldado Nguyen Van Quy, que sofre de câncer no fígado e no estômago, além de ter dois filhos deformados, disse que não vai desistir. "Não é por mim, luto pelos milhões de vítimas vietnamitas. Aqueles que produziam esses químicos tóxicos devem ser responsabilizados", disse.

A indignação vietnamita com a sentença é ainda maior pelo fato de ação semelhante, movida por veteranos de guerra americanos, ter resultado em um acordo, em 1984. Na ocasião, as companhias pagaram US$ 93 milhões em indenizações aos ex-soldados. O precedente foi usado para basear a ação recém-arquivada.

"Se os registros médicos vietnamitas não são suficientemente convincentes, aproveitamos os registros dos soldados americanos no processo", contou o professor Thanh Nhan, um dos organizadores da ação. "Não há razão que explique o fato de aqueles que jogaram o Agente Laranja sobre as pessoas receberem uma compensação e o mesmo direito ser negado às vítimas pela Justiça dos Estados Unidos", emendou.

Fonte: http://www.consciencia.net/2005/mes/06/vietnaeua-impunidade.html _-_ Acesado em 19 de junho de 2010.

domingo, 20 de setembro de 2009

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

Exércitos privados mimetizam Forças Armadas dos EUA

FOLHA DE SÃO PAULO

Empresas mercenárias, como a Blackwater, "são capazes de derrubar um pequeno governo", afirma autor americano Jeremy Scahill diz que governos não precisam mais de aliados - basta alugar soldados; empresas agem em impunidade quase total.
ANDREA MURTA - DA REDAÇÃO

A empresa americana Blackwater começou a aparecer para o público em 2004, quando quatro de seus "agentes privados de segurança" - nome eufemístico dado a mercenários modernos - foram mortos, mutilados e queimados por uma multidão furiosa na cidade iraquiana de Fallujah.
Em 2007, novas manchetes dedicadas à Blackwater deram pistas do motivo do ódio de iraquianos a agentes privados: mercenários da empresa mataram 17 civis em Bagdá, em ação, segundo investigação do FBI, absolutamente injustificada.
E os mercenários não estão no Iraque por acaso: são contratados pelos EUA para, principalmente, fazer a segurança de diplomatas e instalações -com ação facilitada pela quase completa impunidade. Para Jeremy Scahill, autor de "Blackwater -A Ascensão do Exército Mercenário Mais Poderoso do Mundo" (Companhia das Letras, 2008, R$ 52), os negócios andam tão bem para empresas mercenárias que elas já "são capazes de derrubar um pequeno governo". E atuam, inclusive, na América Latina. Leia a seguir a entrevista que ele concedeu à Folha.

FOLHA - Como a Blackwater reflete a história da guerra moderna?
JEREMY SCAHILL - Ela representa a nova face das guerras travadas pelos EUA. Desde a Segunda Guerra, o governo americano vem privatizando radicalmente suas capacidades militares. No Iraque, há mais agentes privados do que soldados americanos. A Blackwater formou um aparato paralelo das forças de segurança: tem Força Aérea, Marinha, aeroportos. E 90% dos contratos da Blackwater são com o governo americano.
Agora estão trabalhando em sua própria agência de inteligência, uma CIA particular. Veja, atualmente os EUA têm 16 agências governamentais de inteligência, com um orçamento conjunto de entre US$ 40 bilhões e US$ 60 bilhões -o número exato é secreto. 70% desse orçamento é usado para pagar serviços de empresas privadas. Quem garante que uma empresa privada que tem milhões em contratos com o governo americano não vai incluir em relatórios para outros governos informações que são de interesse da Casa Branca?

FOLHA - Qual a relação dos mercenários com a guerra ao terror?
SCAHILL - São parte essencial da guerra ao terror. Um presidente como George W. Bush pode ganhar muito com essas empresas. Ele não precisa mais formar uma coalizão com governos estrangeiros nem lidar com uma opinião pública internacional hostil. Pode pagar por uma coalizão de corporações, que vão contratar mercenários, inclusive em países cujos governos se opõem às guerras.
Isso aconteceu no Chile, que votou contra a invasão do Iraque quando era membro rotativo do Conselho de Segurança da ONU. O governo Bush, através da Blackwater, enviou para o Iraque centenas de chilenos.
Outra questão é que, como não há contagem oficial das mortes dos agentes privados, isso encobre o custo humano. Os americanos pensam que há 150 mil soldados no Iraque, mas há outros 180 mil mercenários contratados pelo governo. Então na verdade são mais de 330 mil soldados.
E não há leis sendo aplicadas sobre a punição de agentes privados em caso de abuso. Isso é uma ameaça à segurança das pessoas do mundo todo, porque não param de crescer esses exércitos privados com capacidade suficiente para derrubar um pequeno governo.

Mercenários expandem ações na América Latina Colômbia e Bolívia já estão na mira da Blackwater

FOLH DE SÃO PAULO

DA REDAÇÃO

Se a ação de empresas mercenárias no Iraque é conhecida, a atuação na América Latina ainda anda longe dos olhos do grande público. Mas empresas como a americana Blackwater estão cada vez mais envolvidas com a guerra às drogas na Colômbia e fazem negócios com a brasileira Embraer. Leia a continuação da entrevista do jornalista americano Jeremy Scahill sobre mercenários. (ANDREA MURTA)

FOLHA - Como os mercenários atuam na América Latina?
SCAHILL - Neste exato momento, a Blackwater está participando de uma gigantesca concorrência para trabalhar para o governo americano em sua "luta contra as drogas". Esse programa, na América Latina, visa a agir na Colômbia e na Bolívia. Nesses países já há outra empresa do tipo, a DynCorp, que faz serviços para os EUA no que deveria ser ação antidrogas, mas que não passa de contra-insurgência. Os EUA repassam a Bogotá milhões de dólares ao ano dentro do Plano Colômbia, e estima-se que o governo colombiano gaste quase a metade com empresas mercenárias.
Elas treinam forças locais, pilotam helicópteros e já participaram de confrontos internos. No Brasil, a Embraer recentemente vendeu uma aeronave de combate Super Tucano para a Blackwater, em um acordo autorizado pelo governo Lula, em negociações com os EUA. Acho que isso levanta questões sérias sobre por que o Brasil acredita ser adequado vender aviões a uma empresa com uma reputação de abusos e violência no mundo inteiro. Até porque a América Latina é a próxima fronteira para essas empresas.

FOLHA - O sr. crê que a Blackwater dá proteção adequada a seus empregados?
SCAHILL - Essa é uma das ironias da Blackwater. Na maior parte dos casos, eles têm equipamentos melhores e pessoal mais qualificado do que um soldado comum americano, mas às vezes enviam equipes muito mal preparadas para situações muito perigosas. E é comum que contratados de países pobres sejam destacados para a linha de frente. E recebem menos: colombianos recrutados pela Blackwater foram enviados ao Iraque com um salário de US$ 34 por dia, enquanto um agente americano chega a receber US$ 650 diários. Parece que a vida de um colombiano vale menos, para a Blackwater, do que a de um americano.

FOLHA - A Blackwater também defende interesses econômicos e internos da Casa Branca?
SCAHILL - Sim. Atua na vigilância de investimentos americanos no exterior, por exemplo, nos planos de oleoduto na região do mar Cáspio. E tem forte atuação dentro dos EUA. Foram contratados para patrulhar Nova Orleans depois do furacão Katrina (2005). Acabaram de abrir um enorme centro de treinamento em San Diego (Califórnia), a poucos quilômetros da fronteira com o México, para treinar as patrulhas de fronteira. E discute-se a privatização da polícia de fronteira dos EUA.

FOLHA - Como os mercenários afetam a política mundial?
SCAHILL - As conseqüências são muito sérias. Os governos estão abrindo mão do monopólio da força e da "violência organizada", que é uma das coisas que definem o Estado. Agora há empresas privadas que têm a força e o poder de fogo para potencialmente substituir a necessidade de alianças como a Otan. A parte mais deprimente é que a penetração dos mercenários já foi longe demais, não sei como pode acabar.

MERCENÁRIOS NO IRAQUE ( PMC - PRIVATE MILITARY COOMPANY)



O mundo era um lugar muito diferente em 10 de setembro de 2001,quando Donald Rumsfeld subiu ao pódio do Pentágono para fazer um de seus primeiros longos discursos como secretário da Defesa do presidente George W. Bush.
Para a maioria dos americanos, a Al Qaeda não existia, e Saddam Hussein ainda era o presidente do Iraque.Rumsfeld já havia ocupado aquele cargo uma vez sob o presidente Gerald Ford, entre 1975 e 1977 —, mas voltara ao posto em 2001 com idéias Ambiciosas. Naquele dia de setembro do primeiro ano da administração Bush,Rumsfeld dirigiu-se aos funcionários do Pentágono encarregados de supervisionar os altos negócios dos contratos de defesa — gerenciando as Halliburtons, DynCorps e Bechtels. O secretário estava diante de um ruidoso grupo de ex-executivos da Enron, Northrop Grumman, General Dynamics e Aerospace Corporation — gente que ele havia inserido como seus altos delegados no Departamento de Defesa — e fez uma verdadeira declaração de guerra. “O assunto de hoje é um adversário que representa uma ameaça, uma séria ameaça à segurança dos Estados Unidos da América”, trovejou Rumsfeld.1“Esse
adversário é um dos últimos bastiões do planejamento central no mundo de hoje. Seu governo se faz com base em planos qüinqüenais. De uma única capital,ele tenta impor suas exigências por meio de fusos horários, continentes, oceanos e mais além.Com brutal coerência,sufoca o pensamento livre e esmaga novas idéias.Desorganiza a defesa dos Estados Unidos e põe em risco as vidas de homens e mulheres de uniforme.” Fazendo uma breve pausa em prol do efeito dramático,Rumsfeld — ele próprio um veterano da Guerra Fria — disse então a sua nova equipe:“Talvez esse adversário lembre a antiga União Soviética, mas ela é um inimigo que não existe mais: hoje, nossos inimigos são mais sutis e implacáveis. Talvez vocês imaginem que eu esteja descrevendo um dos últimos ditadores decrépitos do mundo.Mas os dias desses ditadores também estão quase terminados, e eles não são páreo para a força e o tamanho do adversário a que me refiro. Esse adversário está mais perto de casa. É a burocracia do Pentágono.” Rumsfeld estava propondo uma mudança geral na administração do Pentágono, a substituição da velha burocracia do Departamento de Defesa por um novo modelo, baseado no setor privado. O problema, explicou ele, era que, diferentemente dos negócios,“os governos não podem morrer; por isso, precisamos
encontrar outros incentivos que façam a burocracia se adaptar e melhorar”. O que estava em jogo, declarou, era assustador — “uma questão de vida e morte, em última instância, para todos os americanos”.Naquele dia, Rumsfeld anunciou uma grande iniciativa para modernizar a capacidade de intervenção do setor privado nas guerras empreendidas pelos Estados Unidos, e previu que sua iniciativa encontraria feroz resistência.“Alguns poderão perguntar: ‘Como pode o secretário de Defesa atacar o Pentágono diante de seus próprios funcionários?’”, continuou Rumsfeld,dirigindo-se a sua platéia.“A esses, respondo que não tenho intenção de atacar o Pentágono; quero libertá-lo.Nós precisamos salvar esta instituição de si mesma.” Na manhã seguinte, o Pentágono seria literalmente atacado, quando o vôo 77 da American Airlines — um Boeing 757 — chocou-se contra sua face oeste. Rumsfeld ficaria famoso por ajudar a resgatar corpos dos escombros.Mas não demoraria muito para que ele, o grande mestre do militarismo, aproveitasse a quase inimaginável oportunidade oferecida pelo 11 de setembro para acelerar sua guerra pessoal, exposta apenas um dia antes. O mundo havia mudado de maneira irreversível, e num instante o futuro da mais poderosa força militar do planeta se tornara uma tela em branco, na qual Rumsfeld e seus aliados poderiam pintar sua obra-prima.A nova política do Pentágono dependeria muito do
setor privado, daria ênfase a operações secretas, a sofisticados sistemas de armamentos e ao grande uso de forças especiais e de prestadores de serviço. Isso ficou conhecido como a Doutrina Rumsfeld.“Precisamos promover uma abordagem mais empresarial: uma abordagem que incentive as pessoas à pronta ação, e não à reação, e a se comportarem menos como burocratas e mais como capitalistas empreendedores”, escreveu Rumsfeld, no verão de 2002, num artigo para a revista Foreign Affairs intitulado “Transformando os militares”.2 A abordagem “minimalista”de Rumsfeld abriu a porta para uma das mais significativas tranformações na guerra moderna — o amplo uso de prestadores de serviço,ou contratados, em todos os aspectos da guerra, inclusive em combate. Entre os que logo receberam chamados da administração para se juntar a uma “guerra global ao terror”, a ser lutada de acordo com a Doutrina Rumsfeld, havia uma companhia pouco conhecida que funcionava em um campo particular
de treinamento militar perto de Great Dismal Swamp, um pântano da Carolina do Norte. Seu nome era Blackwater USA.Depois da grande tragédia do 11 de setembro, praticamente da noite para o dia uma empresa que mal existia até poucos anos antes se tornaria peça central na guerra global desencadeada pelo império mais poderoso da história.“Trabalho no ramo de treinamento há quatro anos e estava começando a ficar um pouco cínico quanto à seriedade com que as pessoas encaram a segurança”, disse o proprietário da Blackwater, Erik Prince, ao entrevistador da Fox News, Bill ’Reilly, pouco depois do 11 de setembro.“Agora, meu telefone não pára de tocar.” 3 Mas a história da Blackwater não começa no 11 de setembro,nem com seus executivos ou mesmo com sua fundação.De certa forma, ela resume a história da guerra moderna. Em essência, a Blackwater é o coroamento da obra de uma vida inteira daqueles que formaram o cerne da equipe de guerra da administração Bush.
Durante a Guerra do Golfo, em 1991, Dick Cheney — grande aliado de Rumsfeld — era secretário da Defesa.Na época, dez por cento das pessoas posicionadas na zona de guerra estava ali por força de um contrato privado, uma porcentagem que Cheney tinha o firme propósito de aumentar.Antes de deixar o cargo, em 1993, ele encomendou um estudo a uma companhia que acabaria por dirigir: a Halliburton.Tratava-se de um estudo sobre como privatizar rapidamente a burocracia militar. Quase da noite para o dia, a Halliburton criaria sozinha uma indústria de prestação de serviços militares aos Estados Unidos no exterior, com um potencial de lucros aparentemente infinito. Quanto mais agressivamente os Estados Unidos expandissem seu alcance militar, melhor
para os negócios da Halliburton. Era um protótipo para o futuro.Nos oito anos
seguintes do governo Bill Clinton, Cheney trabalhou no American Enterprise Institute, influente grupo neoconservador de pesquisas interdisciplinares que
liderou a investida por uma aceleração no processo de privatização do governo
e das Forças Armadas norte-americanas. Por volta de 1995, Cheney estava no
comando da divisão da Halliburton que se tornaria o maior prestador de serviços
de defesa aos Estados Unidos. O presidente Clinton apoiou em grande parte esses planos de privatização, e a empresa de Cheney — assim como outras prestadoras
de serviços — fechou lucrativos contratos durante o conflito dos Bálcãs,nos anos 90, e na guerra do Kosovo, em 1999. Em meados da década de 90,uma empresa de consultoria militar baseada na Virgínia, a Professional Resources Incorporated, dirigida por graduados oficiais aposentados, foi autorizada pela administração Clinton a treinar tropas croatas para sua guerra separatista contra a Iugoslávia dominada pelos sérvios; um contrato que em última análisedesequilibrou a balança naquele conflito. Esse contrato foi o prenúncio de um tipo de envolvimento do setor privado que se tornaria padrão na guerra ao terror. Mas a privatização foi apenas parte de um programa mais abrangente.Cheney e Rumsfeld foram membros-chave do Projeto para um Novo Século Americano (PNAC), iniciado em 1997 pelo ativista neoconservador William Kristol.4 O grupo fez pressão para que Clinton promovesse uma mudança de regime no
Iraque,e seus princípios,que advogavam “uma política de força militar e clareza
moral”,5 formariam as bases de grande parte da política externa da administração
Bush.



Em setembro de 2000, apenas meses antes de seus membros passarem a integrar o núcleo central do governo Bush, o Projeto para um Novo Século Americano lançou um relatório chamado Rebuilding America’s Defenses: Strategy,Forces and Resources for a New Century [Reconstruindo as defesas dos Estados Unidos: estratégia, forças e recursos para um novo século].Ao expor a visão do PNAC sobre a revisão da máquina de guerra norte-americana, o relatório reconhecia que “o processo de transformação, ainda que portador de mudanças revolucionárias, provavelmente será longo, caso não haja algum
evento catastrófico ou catalisador — como um novo Pearl Harbor”.6 Um ano depois, os ataques do 11 de setembro forneceriam o necessário catalisador: uma justificativa sem precedentes para o avanço desse programa radical, moldado por um pequeno núcleo de agentes neoconservadores que haviam acabado de assumir o poder oficial.
Paralelamente às guerras do período posterior ao 11 de setembro, desenrolou-se um subenredo freqüentemente ignorado: o da terceirização e da privatização que esses conflitos possibilitaram. Desde o momento em que a equipe de Bush tomou o poder, o Pentágono abarrotou-se de ideólogos como Paul Wolfowitz,Douglas Feith,Zalmay Khalilzad e Stephen Cambone,bem como de ex-executivos de grandes empresas — muitas delas grandes fabricantes de armamentos —, como o subsecretário de Defesa Pete Aldridge (Aerospace Corporation), o ministro do Exército Thomas White (Enron), o ministro da Marinha Gordon England (General Dynamics) e o ministro da Aeronáutica James Roche (Northrop Grumman).A nova liderança civil do Pentágono chegou ao poder com dois objetivos principais: a mudança de regime em nações estratégicas e a implementação da operação de privatização e terceirização mais abrangente da história militar dos Estados Unidos — uma revolução nos assuntos militares. Depois do 11 de setembro, essa campanha não pôde mais ser detida.
A rápida derrota do Talibã no Afeganistão revigorou Rumsfeld e o governo, o que possibilitou o planejamento da pedra angular da cruzada neoconservadora: o Iraque.Desde o primeiro momento em que as tropas dos Estados Unidos começaram a se agrupar,durante os preparativos para a invasão,o Pentágono fez dos contratos particulares parte integral das operações.Mesmo enquanto o país aparentava publicamente envidar esforços diplomáticos,a Halliburton se preparava, a portas fechadas,para a maior operação de sua história.Quando os tanques norte-americanos entraram em Bagdá, em março de 2003, transportavam com eles o maior exército de prestadores de serviços já empregado numa guerra.Ao final do mandato de Rumsfeld, estima-se que havia cerca de 100 mil contratados em território iraquiano — quase um para cada soldado norte-americano em ação.7 Para grande satisfação da indústria da guerra, antes de sair, Rumsfeld tomou a extraordinária medida de classificar esses prestadores de serviços como parte oficial da máquina de guerra dos Estados Unidos.Na Revisão Quadrienal do Pentágono de 2006, Rumsfeld esboçou o que chamou de um “guia para a mudança” no Departamento de Defesa, que afirmou ter começado em 2001.8O documento definia a “Força Total do Departamento” como “os componentes
militares ativos e da reserva, bem como os servidores civis e contratados — constituindo nosso efetivo e nossa capacidade de guerra.Membros da Força Total
servem em milhares de lugares ao redor do mundo,desempenhando vasta gama de tarefas no cumprimento de missões críticas”.
Da maneira como foi feita, em meio a uma guerra global sem limites ou definição precisa, essa oficialização formal representou uma negação radical dos agourentos alertas lançados pelo presidente Eisenhower em sua mensagem de despedida à nação, décadas antes,advertindo para o que ele via como as “graves implicações” da ascensão do “complexo militar-industrial”. Em 1961, Eisenhower declarava: “O potencial para a ascensão desastrosa de um poder mal exercido existe e continuará existindo.Não devemos jamais permitir que o peso dessa combinação ponha em perigo nossas liberdades e nossos processos democráticos. Nada está garantido. Somente uma cidadania alerta e bem informada pode manter o entrosamento apropriado da grande maquinaria industrial e militar de defesa com nossos métodos e metas pacíficos, de tal forma que a segurança e a liberdade possam prosperar juntas”. O que se concretizou nos anos seguintes, e em especial na administração Bush, não foi nada menos do que o exato cenário que Eisenhower profetizara de forma sombria. Embora a guerra ao terror e a ocupação do Iraque tenham dado origem a inúmeras empresas, poucas tiveram uma ascensão tão meteórica quanto a Blackwater ao poder, ao lucro e à proeminência — talvez nenhuma outra. Em menos de uma década, a Blackwater saiu de um pântano na Carolina do Norte para se tornar uma espécie de Guarda Pretoriana da “guerra global ao terror” movida pela administração Bush.Hoje, ela tem mais de 2,3 mil soldados particulares operando em nove países,inclusive dentro dos Estados Unidos.Mantém um banco de dados com 21 mil ex-agentes e soldados das Forças Especiais,além de policiais aposentados, que pode convocar a qualquer momento. A companhia tem também uma frota particular de mais de vinte aeronaves, incluindo-se
aí helicópteros de combate e uma divisão de zepelins de reconhecimento. Seu quartel-general de 28 quilômetros quadrados em Moycock, na Carolina do Norte, é a maior instalação militar privada do mundo, treinando por ano dezenas de milhares de agentes da lei, locais ou federais, bem como soldados de países estrangeiros “amigos”.A Blackwater tem sua própria divisão de inteligência e conta, entre seus executivos, com ex-oficiais de inteligência e ex-militares graduados. Recentemente, iniciou-se a construção de novas instalações na Califórnia (“Blackwater West”) e em Illinois (“Blackwater North”), assim como de um campo de treinamento na selva filipina. A companhia possui mais de 500 milhões de dólares em contratos com o governo — e isso não inclui seu orçamento secreto de operações “clandestinas” para agências de inteligência dos Estados Unidos ou para empresas, indivíduos e governos estrangeiros. Como observou um congressista norte-americano, em termos estritamente militares, a Blackwater poderia depor muitos governos do mundo.
É,portanto,um Exército particular,controlado por uma única pessoa:Erik Prince, um megamilionário cristão de extrema direita que tem sido um dos maiores financiadores não apenas das campanhas do presidente Bush, como também da direita cristã em geral. Na verdade, até a elaboração deste livro, Prince nunca havia doado um tostão para um candidato democrata — certamente um direito seu, mas, por outro lado, um comportamento incomum para o proprietário de uma empresa tão poderosa em serviços bélicos e que revela tanto sobre a sinceridade de seu compromisso ideológico. A Blackwater tem constituído um dos batalhões mais eficientes na guerra de Rumsfeld no Pentágono, e Prince fala com ousadia do papel de sua companhia na radical transformação da força militar dos Estados Unidos.“Quando você envia alguma coisa e
quer que ela chegue no dia seguinte, usa o correio ou a FedEx?”, perguntou ele durante um recente painel de discussão com oficiais militares.“Nossa meta é fazer pelo aparato de segurança nacional o que a FedEx fez pelo serviço postal.”9 Talvez o sinal de transformação mais revelador tenha sido dado quando a Casa Branca terceirizou o serviço de proteção a funcionários governamentais mais graduados no Iraque,entregando-o à Blackwater a partir de 2003.



Quando L. Paul Bremer, enviado de Bush no primeiro ano da ocupação, instalou-se em
Bagdá para implementar os planos do presidente, estava sob a proteção da Blackwater, assim como sob sua proteção estiveram todos os sucessivos embaixadores norte-americanos no Iraque.Em comparação com os soldados da ativa, muito mal remunerados,os guardas da Blackwater recebem salários de seis dígitos.“ Antes, os salários comuns para profissionais de segurança pessoal [no Iraque] giravam em torno de trezentos dólares [por pessoa] por dia”, relatou a revista Fortune na época. “Quando a Blackwater começou a recrutar homens para seu primeiro grande trabalho, dar proteção a Paul Bremer, o pagamento saltou para seiscentos dólares por dia.”10 Quase sem nenhum debate público, a administração Bush terceirizou funções historicamente conduzidas pelos militares. E, em grande medida, essas companhias particulares não prestam contas aos contribuintes norte-americanos, de quem extraem seus lucros. Alguns começaram a comparar o mercado mercenário no Iraque com a Corrida do Ouro no Alasca ou com episódios do Velho Oeste.Como observou o Times lon-
drino à época:“No Iraque, a indústria que vem florescendo no pós-guerra não é a do petróleo. É a da segurança”.11 Enquanto esse inaudito exército privado se expandia no Iraque, o último ato de Bremer antes de se esgueirar para longe de Bagdá, no dia 28 de junho de 2004, foi um decreto conhecido como Ordem 17, isentando de eventuais processos penais os prestadores de serviços no país.12 Foi um ato significativo no
mar de políticas (e de ausência de políticas) que regulamentam a ocupação,um
incentivo às forças privadas. Enquanto soldados dos Estados Unidos têm sido
processados por matanças e torturas no Iraque,o Pentágono não impôs as mesmas regras às vastas forças privadas. Esse assunto foi abordado durante uma das raras audiências no Congresso norte-americano sobre os contratados no Iraque, que ocorreu em junho de 2006.Nela, que ouviu também diversos funcionários governamentais, a Blackwater representou a indústria. O congressista Dennis Kucinich questionou Shay Assad, diretor de licitações e aquisições do Pentágono — a seção do Departamento de Defesa responsável pela contratação de serviços. Kucinich observou que as tropas norte-americanas, sujeitas às regras de combate, respondiam a processos por violações de conduta no Iraque, o mesmo não acontecendo com os prestadores de serviços. Até a data daquela audiência, prosseguiu ele,“nenhum fornecedor de segurança privado havia sido processado”.13 Em seguida, perguntou diretamente a Assad: “Será que o Departamento de Defesa estaria preparado para um eventual processo
movido contra um prestador de serviço acusado de ter comprovada e ilegalmente matado um civil?”. “Não posso responder a essa pergunta, senhor”, respondeu Assad.
“Uau!”, retrucou Kucinich.“Pense no que isso significa. Esses prestadores de serviços podem escapar impunes de um assassinato.” Os contratados, disse Kucinich, “parecem não estar sujeitos a nenhuma lei e, portanto, dispõem de licença para fazer justiça com as próprias mãos”. A Blackwater já declarou abertamente que suas forças estão acima da lei.Ao resistir às tentativas de submeter seus soldados ao Código Unificado de Justiça Militar (UCMJ) do Pentágono — insistindo em que eles são civis —,a companhia afirmou gozar de imunidade também no tocante a processos civis nos Estados Unidos, alegando que suas forças são parte do efetivo militar norte-americano, a chamada Força Total. A empresa tem argumentado em depoimentos legais
que, se os tribunais permitirem que ela seja processada por crimes cometidos
por seus contratados, isso poderia ameaçar a capacidade bélica da nação:“Para
que prestadores de serviços responsáveis possam acompanhar as Forças Armadas
dos Estados Unidos no campo de batalha, é essencial que sua isenção de responsabilidade por baixas seja protegida pelo governo federal e aplicada uniformemente nos tribunais federais.Nada poderia ser mais destrutivo ao conceito
de Força Total subjacente à doutrina do poderio militar norte-americano — conceito este que se apóia no amplo voluntariado — do que expor seus componentes privados aos sistemas de responsabilização penal de cinqüenta estados,transportados para campos de batalha no exterior [...] Trata-se de matéria que foge à alçada [dos tribunais] tanto quanto foge também dessa alçada a forma como o presidente supervisiona e comanda essas operações militares, incluindo- se aí as decisões tomadas por meio da cadeia de comando referentes a treinamento,movimentação, armamentos, missões, composição, planejamento,análise, gerenciamento e supervisão de fornecedores militares privados, bem como de suas missões”.14 Em vez disso, a Blackwater alega que suas forças operam com base num código de conduta próprio, escrito por sua própria associação, ironicamente chamada Associação Internacional de Operações de Paz (International Peace Operations Association). Erik Prince afirma que suas forças são “responsáveis perante o país”,15 como se declarações de lealdade à bandeira constituíssem prova de motivos ou atos justos, ou como se oferecessem um substituto para uma estrutura legal independente. Essa lógica é incentivada não apenas pela imunidade virtual já estendida a esses prestadores de serviços, como também pelo fracasso do Pentágono em supervisionar sua maciça força privada, agora oficialmente reconhecida como parte da máquina de guerra dos Estados Unidos. Tais prestadores de serviços operam numa zona de legalidade difusa, que dá margem a abusos explícitos.No
final de 2006, uma emenda de uma única linha foi inserida em silêncio no maciço projeto de lei, submetido ao Congresso em 2007, que trata dos gastos com a defesa e foi assinado pelo presidente Bush. A emenda permitiria submeter prestadores de serviços em zonas de guerra ao UCMJ do Pentágono, isto é, ao sistema de corte marcial.16 Os militares, porém, já têm problemas suficientes no policiameno de suas próprias forças, e não se há de esperar deles que monitorem com eficiência mais 100 mil contratados privados. Embora a emenda de meras cinco palavras mal estabeleça um sistema de supervisão independente, os peritos prevêem que ela ainda enfrentará feroz resistência por parte da indústria privada da guerra. A despeito do apoio sem precedentes a prestadores de serviços empregados no Iraque,no Afeganistão e em outros lugares,o governo ainda não conseguiu nem sequer contabilizá-los, quanto mais fiscalizá-los. Um relatório do Gabinete de Responsabilidade Governamental (GAO) informava,em dezembro de 2006, que os militares não dispunham de um sistema eficiente de supervisão e que “os funcionários do governo não foram capazes de determinar o número de fornecedores utilizados nas bases do Iraque”.17 O Exército e a Força Aérea foram incapazes de fornecer aos investigadores do GAO“o número de contratados empregados em localidades ocupadas ou a natureza dos serviços que
esses contratados prestaram às forças dos Estados Unidos”. O GAO concluiu que “problemas com o gerenciamento e a supervisão dos prestadores de serviços tiveram um impacto negativo nas operações militares e no moral da unidade, prejudicando a capacidade do Departamento de Defesa de afirmar com alguma segurança se os fornecedores estão de fato cumprindo as exigências contratuais, e se o estão fazendo de forma eficiente em termos de custos”.



Uma semana depois da Rumsfeld deixar o Pentágono, as Forças Armadas dos Estados Unidos estavam tão sobrecarregadas pela guerra ao terror que o exsecretário de Estado, general Colin Powell,declarou:“O Exército ativo está quase falido”.18 Em vez de repensar suas políticas agressivas e as guerras de conquista, a administração Bush e o Pentágono falavam da necessidade de aumentar o tamanho das forças militares. Prince já havia feito sua proposta: a criação do que ele chamou de uma “brigada de contratados”para suplementar a força militar convencional dos Estados Unidos.“Existe consternação no Departamento de Defesa quanto ao aumento de tamanho do Exército permanente”, ele declarou.“Queremos aumentá-lo em 30 mil pessoas, mas nos falaram de custos que variam de 3,6 a 4 bilhões de dólares para tanto. Bem, pela minha matemática, isso dá cerca de 135 mil dólares por soldado [...] Nós certamente poderíamos fazer isso a um preço mais baixo.”19 Foi uma declaração extraordinária, que só poderia vir de um homem de posse de seu próprio exército.Prince gosta de caracterizar a Blackwater como um prolongamento patriótico das forças militares norte-americanas e, em setembro de 2005, emitiu um memorando para toda a companhia
requerendo que seus funcionários e contratados prestassem o mesmo juramento de lealdade à Constituição do país que é feito pelos “clientes da Blackwater ligados
à Segurança Nacional (ou seja,Pentágono, Departamento de Estado e agências de inteligência)”: o de “apoiar e defender a Constituição dos Estados Unidos contra todos os inimigos, externos ou internos [...].Com a ajuda de Deus”.20 Porém, a despeito desse retrato da Blackwater como uma empresa puramente americana que procura defender os indefesos, alguns de seus projetos mais secretos e ambiciosos revelam uma realidade bem diferente e assustadora. Em maio de 2004, ela inscreveu em segredo no Registro Central de Prestadores de Serviços do governo dos Estados Unidos uma nova divisão: a Greystone Limited.Mas em vez de estabelecer a companhia na Carolina do Norte, na Virgínia ou em Delaware, como suas outras divisões, a Greystone foi registrada offshore, em Barbados, no Caribe, e devidamente classificada pelo governo americano como “entidade empresarial isenta de impostos”.21 Os folhetos promocionais da Greystone ofereciam aos possíveis clientes “equipes proativas de assalto” que poderiam ser contratadas “para atender a exigências de segurança existentes ou emergentes, de acordo com as necessidades dos clientes no exterior. Nossas equipes estão prontas para conduzir medidas de estabilização,proteção e recuperação de ativos, bem como retiradas emergenciais de pessoal”. Ofereciam também uma grande variedade de serviços de treinamento, até no
tocante a “operações de defesa e ataque para pequenos grupos”. A Greystone gabava-se de “manter e treinar uma força de trabalho extraída de uma base variada de ex-membros de operações especiais, defesa, inteligência e de profissionais da lei prontos para serem empregados a qualquer momento, em qualquer lugar do mundo”. Ela alegava recrutar seus profissionais em lugares como Filipinas, Chile, Nepal, Colômbia, Equador, El Salvador, Honduras, Panamá e Peru — países cujas forças em grande parte apresentam fichas corridas de respeito aos direitos humanos no mínimo questionáveis. Os formulários de inscrição pediam aos candidatos que indicassem suas qualificações em armas: fuzil AK-47, Glock 19, fuzis da série M-16, carabinas M-4, metralhadoras,morteiros, foguetes e granadas antitanques. Entre os profissionais procurados, havia franco-atiradores, atiradores, peritos em artefatos explosivos e pessoas com experiência em unidades de assalto.No Iraque, a Blackwater desembarcou inúmeros mercenários chilenos, alguns dos quais foram treinados e serviram durante o regime brutal de Augusto Pinochet. “Nós reviramos os confins da Terra para encontrar bons profissionais”, disse o presidente da Blackwater,Gary Jackson.“Os comandos chilenos são muito profissionais e se encaixam perfeitamente no sistema da empresa.
Com as Forças Armadas domésticas sobrecarregadas até o limite — e impossibilitadas de novos recrutamentos por motivos políticos —, resta ao governo dos Estados Unidos batalhar para encontrar aliados que preencham as vagas em sua “guerra global ao terror”. Se os exércitos de outros países não desejam se aliar numa “coalizão da boa vontade”, a Blackwater e seus aliados oferecem outro tipo de solução: a internacionalização das forças militares, com recrutamento de soldados particulares em todo o planeta. Se os governos estrangeiros não querem participar do jogo, soldados estrangeiros — muitos dos quais de países que se opõem às guerras dos Estados Unidos — podem ser alistados a preços módicos. Esse processo, alegam os críticos, não é senão uma subversão da própria existência da nação-Estado e de seus princípios de soberania e autodeterminação.“O uso cada vez maior de contratados, de forças particulares ou do que alguns definiriam como ‘mercenários’ torna mais fácil começar e lutar uma guerra — necessário é apenas o dinheiro, e não a cidadania”, diz
Michael Ratner, presidente do Centro de Direitos Constitucionais (CCR), organização
que abriu processo contra alguns contratados por supostas violações de direitos humanos no Iraque.23 “Quando uma população é convocada para ir à guerra, existe uma resistência, que é necessária até para evitar guerras de autoengrandecimento, guerras tolas ou, no caso norte-americano, guerras imperialistas hegemônicas.Tropas particulares são quase uma necessidade para os Estados Unidos, empenhados em manter um império em declínio. Pense em Roma e em sua crescente necessidade de mercenários. É o mesmo que acontece hoje nos Estados Unidos. Se se tornar difícil controlar uma população raivosa e oprimida mediante uma força policial obediente à Constituição... as tropas particulares podem resolver esse ‘problema’.” Assim como a Halliburton, que é a maior prestadora de serviços do Pentágono, a Blackwater se diferencia de outras empresas que simplesmente lucram com a guerra pelas características específicas da visão de longuíssimo prazo de seus executivos. Essas duas empresas não somente aproveitaram um momento lucrativo, como muitas de suas concorrentes, mas lançaram-se também a cavar um nicho permanente para si próprias por décadas à frente.Todavia, as aspirações da Blackwater não se limitam a guerras internacionais. Suas forças se anteciparam à maioria das agências federais em Nova Orleans, depois
da passagem do furacão Katrina em 2005,quando centenas de mercenários fortemente
armados — alguns recém-chegados do Iraque — espalharam-se pela zona de desastre. Em uma semana, eles foram oficialmente contratados pelo Departamento de Segurança Interna para operar na região, cobrando do governo federal 950 dólares por dia por soldado.24 Em menos de um ano, a Blackwater havia se apropriado de mais de 70 milhões de dólares em contratos federais relacionados com o furacão — cerca de 243 mil dólares por dia.25A empresa viu no Katrina outro momento de grande oportunidade, e logo começou a requisitar permissão para ser contratada pelos governos de todos os cinqüenta estados americanos. Os executivos da Blackwater reuniram-se com o governador da Califórnia, Arnold Schwarzenegger, oferecendo-se para intervir no
estado em caso de um eventual terremoto ou de qualquer outro desastre.“Olha, nenhum de nós gosta da idéia de uma devastação se tornar uma oportunidade de negócio”, disse o funcionário da companhia que assumiu a direção da nova divisão de operações formada depois do Katrina.26“É um fato detestável, mas é assim mesmo.Médicos,advogados,donos de funerárias, até os jornais — todos ganham a vida com as coisas ruins que acontecem.Nós também,porque alguém tem que cuidar disso.” Porém, alguns críticos vêem o emprego de forças da Blackwater no próprio território norte-americano como um perigoso precedente que pode solapar a democracia no país. “Suas ações podem não estar sujeitas às limitações constitucionais que se aplicam aos funcionários públicos federais e estaduais — o que inclui a Primeira Emenda e a Quarta Emenda, que impedem buscas e apreensões ilegais. Diferentemente das forças policiais, essas forças não são treinadas para defender os direitos constitucionais”, diz Michael Ratner,da CCR.“Essa espécie de grupo paramilitar lembra os camisasmarrons dos nazistas, que funcionavam como um mecanismo de sanção
extrajudicial com direito de operar, e que na verdade operava, fora da lei. O
emprego desses grupos paramilitares é uma ameaça extremamente perigosa aos nossos direitos.”
O que se mostra particularmente assustador no papel da Blackwater numa guerra que o presidente Bush chamou de “cruzada” é que os principais executivos da companhia seguem uma agenda voltada para a supremacia cristã. Erik Prince e sua família doaram generosos recursos para a guerra dos direitos religiosos contra a secularização e a favor da expansão da presença do cristianismo na esfera pública.27 Prince é amigo íntimo e benfeitor de alguns dos militantes cristãos mais extremistas do país, como o ex-conspirador de Watergate,Chuck Colson — que acabou se tornando um dos assessores do presidente Bush e pioneiro das “prisões baseadas na fé” — e o líder conservador Gary Bauer, signatário da “Afirmação de princípios” do Projeto de um Novo
Século Americano.Prince, aliás, trabalhou com Bauer na juventude e era amigo íntimo de seu pai. Alguns executivos da Blackwater chegam a se vangloriar de serem membros dos Cavaleiros Soberanos da Ordem de Malta,28 uma milícia cristã formada no século XI, antes das primeiras Cruzadas, com a missão de defender “territórios que os cruzados haviam conquistado dos muçulmanos”.29




Atualmente, a Ordem se gaba de ser “uma organização soberana dentro das leis internacionais, com constituição própria, passaportes, selos e instituições públicas”, e de ter “relações diplomáticas com 94 países”.30 A terceirização das
operações militares dos Estados Unidos em países muçulmanos e em sociedades seculares, deixadas a cargo desses neocruzados, reforça os maiores temores de muitos no mundo árabe, assim como de outros oponentes das guerras do governo Bush.
A maior parte do mundo ouviu falar pela primeira vez em “companhias militares particulares” depois do infame 31 de março de 2004, quando quatro soldados da Blackwater caíram em uma emboscada em Fallujah, no Iraque — um linchamento macabro, que marcou uma guinada na guerra e desencadeou a resistência iraquiana.Muitos dos relatos da mídia na época (e ainda hoje) se referem àqueles soldados obscuros como “contratados civis” ou “trabalhadores estrangeiros para a reconstrução do Iraque”, como se fossem engenheiros, trabalhadores de construção,ajuda humanitária ou especialistas em água. O termo “mercenário” quase não foi usado para descrevê-los. E não por acaso.Na realidade, isso fez parte de uma campanha bastante sofisticada de mudança de imagem organizada pela própria indústria mercenária, e cada vez mais adotada hoje em dia por políticos, burocratas e demais figuras poderosas de Washington e de outras capitais ocidentais. Aqueles homens que morreram em Fallujah eram membros da maior parceira de Washington na “coalizão da boa vontade”—
maior em número do que a totalidade das tropas britânicas —, e ainda assim o mundo não fazia idéia de que eles estavam lá.A emboscada pôs a Blackwater em papel capaz de alterar as regulamentações que supervisionariam (ou não) uma indústria que se expandia a todo vapor, e da qual a companhia era a nova líder. Três meses depois, porém, a empresa assinaria um dos mais valiosos contratos de segurança internacional do governo dos Estados Unidos, responsabilizandose pela proteção de diplomatas em instalações americanas. As mortes largamente anunciadas de quatro de seus soldados se revelariam a mola propulsora que poria a companhia no caminho do sucesso pelos anos seguintes. A história da ascensão da Blackwater é um épico na história do complexo militar-industrial. A companhia é o símbolo vivo das mudanças forjadas pela
revolução nos assuntos militares e pelo programa de privatização radicalmente
ampliado pela administração Bush, tendo a guerra ao terror como pretexto.
Porém, mais fundamental ainda é que ela é uma história sobre o futuro da guerra, da democracia e da governança. Essa história vai do início da Blackwater, em 1996, com seus executivos visionários abrindo um campo de treinamento militar privado (a fim de “atender à demanda do governo pela terceirização do treinamento em armas de fogo e segurança”); passa pelo aumento do volume de contratos depois do 11 de setembro; e chega às ruas encharcadas de sangue de Fallujah, onde os cadáveres dos mercenários foram pendurados em uma ponte.Mas inclui ainda uma troca de tiros nos telhados da fortaleza de Muqtada al-Sadr, em Najaf; uma expedição ao mar Cáspio, rico em petróleo, onde o governo norte-americano mandou a Blackwater construir uma base
militar a poucos quilômetros da fronteira iraniana; uma incursão pelas ruas de
Nova Orleans,devastadas por um furacão; e muitas horas dentro dos centros de decisão em Washington, onde executivos da empresa são recebidos como os novos heróis da guerra ao terror. E, no entanto, a ascensão do mais poderoso exército mercenário do mundo começou bem longe dos atuais campos de batalha, na sonolenta cidade de Holland, em Michigan, onde Erik Prince nasceu de uma dinastia cristã de direita.Foi a família Prince que lançou as bases, gastando milhões de dólares durante muitas décadas, para que as mesmas forças que possibilitariam a meteórica ascensão da Blackwater chegassem ao poder.